Vamos falar sobre bunda?
“O moralista é um invejoso do prazer alheio.
Condena aquilo que não tem coragem para fazer.”
(Andréa Beheregaray)
As redes sociais tornaram-se um campo minado. Análises superficiais são vociferadas em tempo integral, ninguém ouve ninguém, todos querem apenas ter razão. Já falei isso por aqui algumas milhões de vezes. Discussões binárias, rasas, que não levam ninguém a evoluir. Quando acho que devo, exponho minha opinião num post meu, na minha página, mas jamais entro em divididas, não perco meu tempo, não sofro de ilusões. Não tenho a pretensão de doutrinar ninguém, apenas exerço o meu direito de me expressar. Adoraria fazer parte de um debate saudável, onde todos estivessem dispostos a repensar, perceber novas e possíveis teorias, enxergar por outros prismas, crescer. Mas, parecem estar todos estacionados em suas verdades absolutas, abraçados em seus egos.
Acredito que nem mesmo Bauman, quando elaborou sua tese sobre o mundo líquido, imaginou a liquidez das tretas virtuais da atualidade. Acordamos falando da bunda da Anitta e vamos dormir falando da mãe solo barrada com sua cria num boteco descoladex de São Paulo e, no meio do caminho, esbarramos no tapa do Will Smith em Chris Rock na cerimônia do Oscar 2022. Todos necessitam ter uma opinião sobre tudo. Volto a repetir, opiniões rasas que não exploram o todo. Discussões baseadas em bem e mal, certo e errado, ou isso ou aquilo. Visões de um mundo linear que não permite enxergar além do cabresto.
​
Uma dessas últimas discussões que me incomodou bastante foi sobre Anitta, a funkeira popozuda que imprimiu, com muita coragem e se bancando, seu nome no cenário musical internacional e chegou ao topo, tornando-se a número 1, tendo sua música como a mais tocada em plataformas digitais.
​
De um lado, os reacionários, os machistas (aqui cabem homens e mulheres), os falsos moralistas, os fiscais da moral e dos bons costumes que escondem suas caveiras no armário. Gente odiosa que aponta, julga e condena, travestida de sommelier da MPB. Escoram-se em seus supostos bom gostos musicais para atacá-la. A maioria dos preconceituosos não se enxerga como tal e segue espalhando veneno disfarçado de opinião.
​
Anitta é uma mulher bem resolvida que esbanja sensualidade e sexualidade. E ela sabe como fazer isso sem cair no senso comum. Ela tem esse direito e o explora da maneira que bem entende, seja para alavancar sua carreira, seja para se promover como artista, seja para chamar atenção para alguma pauta mais séria. Anitta não inventou isso, mas por que ela incomoda mais que as outras? Porque ela pensa! E uma mulher que pensa incomoda muito mais. Ela dá a cara a tapa, ela se banca, ela é destemida, não se intimida, posiciona-se politicamente mesmo que isso lhe custe fãs e seguidores.
Anitta não é apenas a bunda dela. Os babacas insistem em limitá-la a isso, mas ela é muito mais. Ela é também aquela bunda linda e invejável, claro, mas é o cérebro, o coração, a razão e a voz de muitos. A menina carioca suburbana que tem uma carreira brilhante, estruturada em bases sólidas, regida por ela mesma. E isso incomoda tão mais aos recalcados do que uma bunda que rebola lindamente. A bunda é o bode expiatório de algo que vai muito além do discurso moralista e de sua música de gosto duvidoso.
​
Li muita coisa dizendo que Anitta rebaixa as mulheres apenas a “objeto sexual”. Discordo veementemente. São os olhos alheios que a colocam nesse espaço. Ela já provou que não é apenas corpo, mas os mal resolvidos consigo mesmos insistem em classificá-la, enquadrá-la, encaixotá-la. Ela é diversa! Uma mulher belíssima (que sorte a dela!), inteligente, com consciência de classe, destemida. Admiro sua capacidade de não estacionar diante das críticas e dos julgamentos dos pseudomoralistas. Anitta banca suas atitudes, segura a onda de um mundo misógino, e isso a torna ainda mais bela.
​
Estamos diante de um verdadeiro MULHERÃO DA PORRA. Não tenho uma filha, mas se tivesse adoraria que ela se desenvolvesse com esse tipo de personalidade, aquela que imprime a sua marca, respeitando-se, e dane-se todo o resto. Dona se si, sem amarras. Enquanto mãe de menino, conduzo-o pelo caminho do respeito, da admiração e da compreensão. Jamais do julgamento, do preconceito e do machismo.
Aprendi com o feminismo que milito e pratico, que uma mulher pode ser tudo aquilo que ela quiser. Ela pode, inclusive, ser aquilo que outras “feministas” condenam. Aliás, os mesmos que condenam a burka também condenam um corpo exposto. Contraditório, não?
​
Uma mulher não pode e não deve ser frustrada para atender a expectativas e padrões impostos. Que sejamos bundas, seios, coxas! Que sejamos nossa sexualidade plena e bem resolvida!
​
Aos moralistas, apenas um recadinho:
​
Abram alas que vamos passar! O choro e o recalque são livres! Respeita as mina!
​