top of page
Cuba vive e respira

“Se você é capaz de tremer de indignação a cada vez que

se comete uma injustiça no mundo, então somos companheiros.”

(Che Guevara)

 

Sempre fui uma apaixonada por Cuba e sua história. Amores são difíceis de explicar. Muitas vezes, as palavras roubam o melhor dos sentimentos. Tarefa árdua a de tentar traduzi-los com exatidão, pois não há dicionário que consiga esse milagre. O sentir sempre será melhor, mas ele é individual e intransferível. Adoraria dividir, através de uma espécie de osmose, tudo aquilo que meu coração palpita nesse momento. Como disse Tolstói, “Há quem passe por um bosque e só veja lenha para fogueira”. Assim como há quem observe Cuba e a enxergue apenas através do véu do preconceito, da ignorância e das inverdades convenientes lidas em fontes parciais.  

 

Vou aqui, em vão, tentar esboçar um pouquinho do que vivi e respirei em Cuba, durante oito preciosos dias de junho de 2022. Começo pegando carona numa frase de Che, “Deixe-me dizer-lhe, correndo o risco de parecer ridículo, que o verdadeiro revolucionário é guiado por grandes sentimentos de amor.” E Cuba transpira esse amor, esse ideal, esse sonho revolucionário realizado. Impossível estar lá e não ser atingido por esse golpe de prazer e de vitória.

 

A gente sai do capitalismo, mas ele não sai da gente. Por mais idealistas e engajados que sejamos, estamos contaminados pelo consumismo e o imediatismo. Deixemos as hipocrisias de lado. A ausência de uma internet 24 horas por dia ao alcance de todos é nosso primeiro tapa na cara. Dá para viver offline? Claro que dá! Mas viver conectado já está tão entranhado em nós que uma espécie de síndrome de abstinência nos atinge nas primeiras horas. A consciência de que somos mais capitalistas do que gostaríamos nos envergonha e se choca com nossas ideologias. Paradoxos! Cuba é um lugar de contradições constantes.  Uma pequeníssima faixa de terra, mas com uma imensa relevância para o mundo.

 

A população cubana vive as severas consequências de um embargo que se perpetua por 60 anos, o que torna tudo mais escasso ou inexistente. Há filas para se entrar nos mercados e as prateleiras não são fartas, encontrando-se apenas o básico para subsistência. Não há biscoitos, salgadinhos, refrigerantes, cervejas, chocolatinhos e afins. Há comida e ponto. Não existe um farto comércio, lojas são raríssimas. Os itens de higiene também são mais complexos de se conseguir. Ninguém me pediu dinheiro na rua, mas me pediram sabonete e creme.

 

Esse é o preço que pagam por não se curvarem diante do imperialismo estadunidense e seus seguidores, e isso tem tanto valor, tanta dignidade. Render-se jamais! E seguem-se os ideais da revolução, apesar de tudo, contra tudo, remando em frente.

 

Mesmo eu sendo uma entusiasta da Revolução Cubana, e ter um olhar romântico sobre ela, não a enxergo como perfeita, tenho minhas críticas e ressalvas, nada relevantes aliás, principalmente no que diz respeito ao sistema ditatorial. Vale ressaltar que o objetivo deste texto também não é esse, não sou uma expert no assunto e não me sinto apta a analisar profundamente o tema. Apenas divido aqui o que vi e senti, deixando as análises por conta do leitor.

 

As ruas de Havana são cheias de charme e história. A cada esquina que se dobra, um novo deslumbramento. Sua arquitetura e seus carros antigos nos transportam para um tempo diverso, onde, aos poucos, sacamos que não precisamos nem de um quarto de tudo que temos para existir. O povo pulsa arte, cultura e ancestralidade africana. São alegres, receptivos, carinhosos.

 

Não presenciei nenhum tipo de violência. Na minha testa estava estampado “turista” e uma turista carrega em sua bolsa euros, a moeda mais utilizada por lá depois do peso cubano, celular e coisinhas diversas. Andei longos percursos pelas madrugadas cubanas, livremente e sem medo. Não há pessoas morando nas ruas, como na São Paulo capitalista. Na Havana socialista, o pouco é fracionado entre todos, garantindo que não falte para ninguém.  

 

Sonhei ser Hemingway sentada na Plaza Vieja, num fim de tarde, tomando cerveja e ouvindo música. Entendi na essência o porquê ele escolheu aquele cantinho do mundo para viver e escrever. Viajei lindamente nesse sonho!

 

Aliás, Habana Vieja, é um dos lugares mais mágicos que tive a sorte de pisar nesse globo. Existe um encantamento naquelas vielas que nos causa pesar de voltar à realidade cosmopolita. Foi uma das minhas despedidas mais sentidas. O clima, o céu, os sons, os sabores, os aromas, tudo, absolutamente tudo, em perfeita sintonia. O universo ainda conspirou e me brindou com deliciosas companhias. Entre elas, um sorriso lindo, mas essa já é uma outra história.

 

A cidade não é feita pensando no turismo, apesar de ser uma atividade intensa por lá e de ter muitos hotéis. Esqueça o padrão de chegar nos lobbies e encontrar mil folhetinhos com propagandas de passeios, ofertando serviços diversos. Esqueça a van que te busca de manhã e te devolve à noite. Faça seu roteiro ainda no Brasil e, chegando lá, conte com a sola das suas Havaianas e muita negociação com taxistas. Você pode, ainda, trancar-se num resort em Varadero, mas isso não é viver e respirar Cuba. Fiz questão de ver aquele mar de perto, um dos mais lindos que meus olhos já pousaram, mas foi numa tarde, num bate-volta. Varadero está a duas horas da capital e, fora dos resorts, as praias não possuem estrutura alguma, não existem barraquinhas ou quiosques, esqueça também a cervejinha à beira-mar, o máximo que conseguimos foi alugar espreguiçadeiras embaixo de guarda-sóis de sapê.

 

E é tudo isso que faz Cuba incrível. Ela foge do senso comum, nos arremessa para longe das nossas zonas de conforto (já falei que odeio essa expressão?). Eu não tinha a menor dúvida de que eu amaria essa viagem, mas eu não imaginava um amor tão grande assim. Ainda estou em estado de êxtase, conversando comigo mesma, emocionada, ligando pontos, sonhando acordada, sorrindo entre lembranças. Meu corpo aterrissou no Brasil na última segunda-feira, mas a minha alma ainda não se reconectou, ela ainda vaga por lá, feliz, encantada, leve.

 

Não preciso deixar aqui dicas de lugares a serem visitados, cada um encontra seu caminho, faz seu roteiro de acordo com gostos e preferências, assim como fizemos o nosso, fuçando em livros, sites e blogs diversos. Uma viagem começa assim, muito antes da decolagem, e esse é o grande barato. Mas, se eu puder deixar um conselho é: visitem La Bodeguita del Medio e La Floridita, bares centenários e tradicionais, onde se pode degustar o Daiquiri e o Mojito, respectivamente, preferidos do Hemingway. Tem música, tem história, tem paixão, só tem coisa boa. Procurem também os bares frequentados apenas pelos locais, esses são ainda melhores.

 

Plagiando e adaptando Humphrey Bogart em Casablanca, “Sempre teremos Havana”. Eu volto!

 

iHasta la vista!

 

“As bombas podem matar os famintos, os doentes, os ignorantes,

mas não podem matar a fome, as doenças, a ignorância.”

(Fidel Castro)

 

“Acima de tudo procurem sentir no mais profundo de vocês qualquer injustiça cometida contra

qualquer pessoa em qualquer parte do mundo. É a mais bela qualidade de um revolucionário.”

(Che Guevara)

​

​

​

© 2025 por Fabiana Rongo e Jaimar Martins | Criado com Wix.com

bottom of page