top of page
Todo desencontro traz um encontro

“Creio que quase sempre é preciso um golpe de loucura para se construir um destino.”

(Marguerite Yourcenar)

​

Dia desses, ao entrar nas redes sociais, deparei ao acaso com a foto de um cara com quem eu saía num passado remoto, e peguei-me pensando sobre os caminhos pelos quais a vida tem me conduzido.

​

Na foto, ele aparecia radiante ao lado da esposa grávida. Nós nos distanciamos há algum tempo, portanto, eu desconhecia que ele havia casado, tampouco que seria pai. Porém, a imagem me fez ratificar aquilo que eu já sabia: nunca fomos pares e, por não sermos pares, não tínhamos o porquê dividir a vida.

​

Durante algum tempo, dividimos companhia, bom papo, vinho e prazer. Eu não consegui ir além. Ele era uma pessoa incrível, bacana, inteligente, divertido, cozinhava para nós, mas, isso, para mim, não é o suficiente para transformar alguém em namorado. A admiração é fundamental, mas ela sozinha torna o outro um amigo. A paixão que despertará um futuro amor é ingrediente fundamental no processo dos meus relacionamentos. Posso estar terrivelmente enganada, mas não sei viver de outra forma.

​

Há quem se instale na vida do outro por comodidade, por carência, por medo da solidão e até por utilidade, e aceita viver um romance morno, que atende um lado, mas frustra terrivelmente outro. Nossa biografia, lá na frente, cobrará o preço, e já não dará para voltar atrás. Como já disse por aqui inúmeras vezes, não tenho vocação para ser frustrada, por isso, opto por trilhar o meu caminho sozinha até que o amor recíproco me sorria ou até que chegue o fim dos meus dias. Jamais me ancorarei a ninguém. Não é justo comigo, não é justo com o outro.

​

Esse meu amigo insistiu para que ficássemos juntos e eu recuei. Pego-me pensando como seria se eu tivesse embarcado nessa relação. Será que hoje ele estaria vivendo esse momento tão especial para ele? Eu, mais velha e com um filho já criado, não seria mãe de um filho dele. Nossos planos de vida não convergiam. Ele, também divorciado, tinha em seu histórico a morte de um filho ainda na infância, sonhava em ser pai novamente. Isso me faz ter mais certeza sobre a responsabilidade e o respeito que temos que ter ao entrar e nos fixar na vida do outro. Esses imensos detalhes não podem ser negligenciados.

​

Um pensamento me levou a outro, e me questionei o porquê de o amor não ter abraçado essa nossa história. Essa e tantas outras que vivi e os vínculos afetivos não se estabeleceram. Tanta gente bacana que esbarrei e dividi apenas prazer. A vida tem seus propósitos e seus porquês e tento entendê-los, sem chegar à conclusão alguma. Apenas conjecturas, achismos, devaneios e afins.

 

Assistindo à série Maid, esse questionamento aflorou novamente. No enredo, a personagem Alex, interpretada por Margaret Qualley, vive o drama pessoal de um divórcio. Soma-se à sua bagagem uma filha pequena, uma mãe problemática, um pai negligente, um ex-marido alcoólatra e agressivo e um imenso abismo financeiro. Em meio à sua trajetória de lutas e dramas pessoais, tem o apoio e o amor de um amigo perdidamente apaixonado por ela. A antítese de seu ex-marido. Porém, Alex, apesar de tentar, não consegue levar o relacionamento adiante, pois o carinho e a gratidão não eram ingredientes suficientes para sustentá-lo. Da sua parte, faltou o amor.

​

Eu, no papel de espectadora, tive vontade de invadir a tela e pegá-la pelo pescoço, sacudindo-a até que se tocasse. Mas, no fundo, identifiquei-me profundamente com ela e me solidarizei com essa terrível e triste incompatibilidade de quereres. O querer gostar não nos faz gostar. Que pena! Se assim o fosse, evitaríamos tantos desgastes emocionais. Nosso coração teimoso, mas bem-intencionado, muitas vezes, insiste em gostar de quem não gosta da gente e vice-versa. Desencontros amorosos acontecem o tempo todo. Faz parte da caminhada da vida.

​

Recomendo a série. Chorei do primeiro ao último episódio. Piscianices, talvez. Vi um tanto de mim em cada um daqueles personagens perdidos em si mesmos e lutando para encontrar a saída do labirinto que suas vidas os conduziram. Ficção baseada na mais intensa realidade. Ali, não enxerguei o certo e o errado, enxerguei seres humanos vivendo suas frágeis existências, tentando combater seus lados menos iluminados e escalar o fundo do poço. Assistam! Sintam! Reflitam! Tirem suas próprias conclusões!

​

É preciso que nos olhemos com olhos amorosos e que nos cobremos menos. A vida é um grande ponto de interrogação e só temos o hoje, o instante. Que saibamos viver nos respeitando e, a partir daí, respeitar o próximo. Tudo começa no coração. De dentro para fora, de si para o outro.

​

E foi assim, refletindo a partir de uma foto, de uma história bem vivida que me fez ser feliz por um instante e para vida toda, de uma série, que fortaleci a minha convicção de que não adianta querer enfiar um pé 38 num sapatinho 35. Forçar a barra só trará dor e desconforto. Cinderella também é cultura!

​

Como diz o dito popular, “sempre existe um sapato velho para um pé descalço”. Seguimos!

​

© 2025 por Fabiana Rongo e Jaimar Martins | Criado com Wix.com

bottom of page