A vida é um cobertor curto
“Gostaria de dizer para você que viva como quem sabe que vai morrer um dia,
e que morra como quem soube viver direito.”
(Chico Xavier)
Vivi uma semana de fortes e boas emoções, e as emoções têm o dom de me levar a um looping de sensações que me fazem sorrir e chorar numa fração de segundos. Loucura boa! Ritual de purificação! Quem me conhece intimamente sabe bem como é esse processo. Quantos amigos queridos já foram contaminados ao segurarem as minhas mãos, e sorriram e choraram junto comigo. A todos, meu muito obrigada!
Eu estou no meu melhor momento profissional. Vivo uma realização que me enche de orgulho, que me leva a revisitar um passado tão recente e tão difícil, e afirmar com imensa satisfação “Eu sou foda!” Sim, eu sou! E isso não é soberba, não sou melhor do que ninguém, mas sou infinitamente melhor do que aquele ratinho assustado e teimoso que eu era quando a batalha começou. Após uma árdua e incansável guerra interna, conquistei meu lugar ao sol. Não sou ingênua, e sei que esse lugar é transitório e fugaz, como tudo nesta vida. Nada é, tudo está. Num piscar de olhos tudo pode mudar. A gente pode até abaixar as armas para tomar fôlego e revigorar, mas jamais abandoná-las. Nunca se sabe quando serão novamente necessárias.
Eu vivo a vida com tudo que ela tem direito. Ela é um universo de possibilidades e tudo pode nos acontecer. Eu saboreio cada instante, seja de dor ou de amor ou de frustração ou de realização ou de bobagem. Respiro e absorvo. Se é bom deixo que me domine, como uma brisa boa, como o vinho que me abraça. Permito que entre em meus poros e abasteça o meu estoque de combustível para seguir em frente. Se é ruim, esgoto. Sofro, choro, grito, xingo, sinto até a última gota, até que vire um nada, até que não me faça mais mal, mas que me engrandeça e me fortaleça.
Talvez, esse sentir demais, esse viver em excesso, leve-me à uma exaustão, mas acho que à essa altura da existência, aos 46 anos percorridos, já não saberia viver de outra maneira. Resta-me perseguir um suposto equilíbrio. Será que ele existe ou é mais um dos meus devaneios piscianos? Que seja! Sigamos!
Sou discípula de Guimarães Rosa, “Viver é rasgar-se e remedar-se.” Faz-se necessário!
Nesse turbilhão de emoções que me atingiu durante a semana, lembrei-me da minha querida amiga Hellen me dizendo que a vida é um cobertor curto. Ao cobrirmos a cabeça, descobrimos os pés, e vice-versa. E essa lembrança me levou a refletir. Tenho um emprego que finalmente paga as minhas contas e ainda proporciona aquele vinho bacana, o restaurante bom, a viagem sonhada, o sapato supérfluo, a bolsa a mais que não preciso, mas quero. Por outro lado, existe a doença do meu pai que mina as minhas forças e me coloca diariamente cara a cara com a finitude. Existe uma vida amorosa que não sai do superficial, não há mergulho, porque aos olhos dos meus parceiros, sou legal, sou a melhor companhia do mundo, mas não me enquadro no modelo “bela, recatada e do lar”. Ahhhh... o machismo estrutural! Mas esse é assunto para um outro capítulo da minha história. Não lamento!
Acabei de pegar nas mãos, pela primeira vez, meu segundo livro. Se um já era um sonho distante, imagine dois! Chorei incontrolavelmente! Como são doces as lágrimas da realização! E dá-lhe mais cambalhotas na montanha-russa da minha vida. É no topo que eu miro. E quando lá estou, deixo que os bons ventos varram as tristezas e as frustrações. Não as coloco em lugar de destaque, apenas as respeito.
Sei lá se esse emaranhado de palavras, banhadas por esse excesso de sentimentos, fará sentido para quem se dispuser a ler esse texto, mas para essa pretensa escritora que vos fala, faz um bem danado exteriorizar o que lhe transborda.
A vida é um emaranhado de teias que vão se sobrepondo, e a cada um de nós cabe desembaraçá-las da melhor maneira que conseguirmos. Haverá aqueles nós insolúveis e a serenidade será bem-vinda para nos ajudar a seguir adiante sem lamentar ou sobrecarregar os ombros.
No meu viver não deixo que a saudade me sufoque, não permito que a rotina me acomode ou que o medo me impeça de tentar, tentar e tentar. Desconfio do destino e acredito em mim, nos meus passos e nas minhas escolhas. Gasto mais tempo realizando que sonhando, fazendo que planejando, vivendo que esperando. Acredito que, embora, quem quase morre ainda esteja vivo, quem quase vive já morreu.
Viver é urgente! Bora!